"tudo em mim és tu." |
Fere-me cada vez mais não ter uma gota de
esperança a circular em qualquer uma das minhas veias pelas pessoas. Aquilo a que chamamos de ser humano tão bem pode ser
chamado de lobo, de monstro, de cão pelas suas caraterísticas cada vez mais
persuasivas em colocar os dentes num pedaço de carne. Pedaço de carne, esse que
está colocado no braço de um inocente, o que caminha na rua da grande cidade ou
mesmo na pequena vila – a caminho do trabalho ou do centro de emprego à procura
de um pouco de esperança na vida rotineira portuguesa – com um sorriso, com
inocência apesar de todas as dificuldades enfrentadas e a serem enfrentadas,
tudo depende do ponto de vista e do tempo verbal a ser usado. Tenho uma canção
que pretendo colocar cá para fora de modo a fazer frente a estes monstros,
sentados ao meu lado todos os dias e também para espantar todos os meus medos,
inseguranças e pecados.
Não
tenho confiança nas pessoas por já não me restar um pedaço de fé por elas.
Tenho uma relação especial com Deus – quem enfrenta o que vou despejando neste
pedaço pode notar o quão particular é esta minha relação – uma espécie de
relacionamento a tentar equilibrar o amor e ódio. Uma das questões que me
aterroriza o coração é o facto de se todos fomos criados à Sua semelhança significa que também Ele tem um coração recheado de
maldade? Na minha infância incutiram-me a imagem de um Deus recheado de amor,
pronto a perdoar qualquer pecado acumulado. Bastava conversar com o padre,
confessar as nossas imundices, beijar-lhe as mãos se for preciso para o pedido
chegar até ao céu – uma espécie de paraíso estava reservado a todos os que
fizessem este ritual de todas as vezes em que caíssem na tentação, em que
fizessem sexo só pelo prazer (pergunto-me todos os dias quem não o faz se sabe
tão bem). Mas se os ensinamentos estão corretos então isso quer dizer que Deus
também contém um pouco de maldade, de sentimentos maldosos tal como todos os
monstros que olham para nós na sala de aula, no metro, na minha própria casa em
Lisboa? Este é um dos pontos que me temer o ser humano, apesar de estar apaixonado por um. Posso dizer que tenho a melhor pessoa
neste momento ao meu lado, a amar-me, estou com um sorriso no rosto de todas as
vezes em que estou de mãos dadas, em que coloco cá para fora os meus tormentos,
as minhas ideias, os pedaços da minha alma. Se Deus está recheado de maldade
então há uma outra zona do corpo, do tecido da alma que contém um amor
brilhante pronto a acolher todos os pecadores – assim como também estou,
preparado para receber nos meus braços os que mais gosto e aqueles que nem
sorriem à minha frente.
Precisamos de evolução, meus monstros.
Preciso de regressar daqui a algumas centenas de anos – de ficar a descansar
quando chegar a minha hora, no que diz respeito a esta vida e depois voltar num
novo corpo, numa personalidade completamente diferente – necessito de regressar
e ver a evolução do ser humano, sem que termine o Mundo entretanto. Mesmo com
um aviso de necessidade de evolução bem na minha testa ainda me falta tantas
coisas para aprender. Talvez seja também uma das razões para algumas também
nutrirem confiança no ser humano, tal como eu.
É isso que mais me fere. É essa possibilidade que balança o meu coração
nestes dias de chuva.
Um
dia, vou ser totalmente livre. Uns
daqueles dançarinos de rua com capacidade de beijar ainda mais intensamente,
daqueles que roubam as almas alheias com declarações. Sem promessas à mistura
porque retira a condição humana ao Homem. Precisamos de evolução, de começar a
fazer amor ao invés de sexo, de beijar e não de passar os lábios. O meu coração
regenera ao perceber que afinal tenho um pouco de esperança em mim, em ti, nele
e em qualquer pessoa que passa na rua.
1 comentário:
David, escreves mesmo bem. Gostei muito!
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