14 junho, 2012

Matar fantasmas,


Está na hora de te escrever para te abrir a porta dos meus sentimentos, do meu coração e para te guardar nas minhas memórias. Os meus dedos acarinham pequenos choques por ser capaz de oferecer um pouco de energia ao teu fantasma, no momento em que soletro o teu nome na escuridão do meu quarto e à medida que despejo o passado sobre as carpetes verdes. Esses pequenos choques atormentam a minha lógica, a velocidade com que escrevo e o meu raciocínio para sussurrar o que vai na alma. Quando se fala baixinho, todas as outras pessoas falam igualmente baixo por saberem que se trata de um assunto sério, recheado de insegurança, um assunto inundado em lágrimas e veneno. O teu fantasma está presente ao lado da minha alma, por teres sido mais do que um dia ou uma noite como muitos seres humanos sem qualquer pureza costuma rotular. Nas caçadas noturnas, as minhas elegantes, humanas, todas as que acontecem dentro de um recinto, ao invés de armas, cordas e ferros são colocados quilos de maquilhagem, roupas acabadas de comprar, cremes nas mãos e todos os fios de cabelos são alinhados. Nesta descrição da procura desenfreada por um único beijo que console os músculos, a tesão, suguei-te um pouco a alma à medida que nos beijávamos e pedia-te para “ficares comigo” quando a minha existência precisava unicamente de um ser humano perto. Apesar de todos os outros olhos experimentarem-te e mesmo com o rótulo de uma aventura passageira para aumentar o ego, foste mais, és mais, serás mais daqui a uns anos. Escrevo-te para te libertar de mim, para voares violentamente por todos os céus e conseguires proclamar-te como o conquistador de novas terras, novos desejos e sonhos. Pelo teu telefone conseguiste escrever que te encontravas bem, que não precisavas de mim, a tua ira inflamou-me os cabelos, os meus olhos castanhos e as minhas unhas roídas. Sempre ouvi dizer que qualquer alma curada ou tranquila não sente necessidade de se alimentar de um dos sete pecados mortais, a ira. E quem sabe se não foi buscar um pouco de inveja, questiono-me frequentemente sobre isso.

Num sofrimento pessoal, individual, tinha a alma quebrada por não organizar sentimentos em relação à minha alma gémea. Por saber que a encontrei e não conseguir aceitar que precisava de esperar, de beijar, de respirar um pouco de vida, de ferir as minhas asas antes de deixar de voar. Quando encontrei o amor da minha vida, nem sequer tinha voado por terrenos proibidos, aqueles em que qualquer arma está apontada às duas asas e a morte é iminente. A minha alma derretia-se nos minutos em que me encontraste. Ardia e permanecia numa cova, pronta para a Morte a enterrar, para fechar poucos capítulos numa sala de arquivo. Quando te encontrei, estava desmaiado pelo álcool que circulava pelas veias. Desmaiado ou adormecido, como quiseres chamar. À medida que libertava as minhas mágoas por todos os canos, ao deixar que água escorresse pelo meu rosto para acordar da minha melancolia, senti as tuas mãos sobre os meus cabelos numa tentativa de aconchego. Se as horas que passei fossem transferidas para o presente talvez te tivesse dado um tiro fatal no peito para me deixares sozinho, sem perturbações. Que todas as cobras do Mundo rastejem pelo chão, penso que foi dessa forma que Deus condenou este ser vivo pela maldade provocada a Eva, doce e inocente que descobriu a nudez depois de trincar o fruto proibido. Esse fruto, equivalente a uma maçã, trincado também pela Branca de Neve nos contos de fadas. Sejas a cobra ou o fruto apetecido, a minha garganta asfixiou, as minhas cordas vocais partiram-se no momento em que te pedi para voares por o meu coração estar vazio, por não existir absolutamente nada para oferecer.

Nas tuas lições de voo não te esqueceste da derradeira aula: aplicações da palavra sempre quando alguém pede para sairmos da sua vida. Nesses minutos as tuas penas brilharam à luz do Sol, escrevo-te agora para dar um ponto final. Não desejo parágrafos, pontos finais são mais atraentes quando não existe nem uma gota de compaixão. No inferno aguardam-me todas as cobras venenosas, prontas para enterrar os dentes na minha carne. Sussurro baixinho para todos me levarem a sério, para me levar a sério.

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