Quando os raios solares desaparecem entre os
prédios que vão compondo o meu cenário (que tenta tornar-se, com todas as
forças, no meu habitual ou melhor rotineiro)
os meus dedos passavam sobre os meus fios de cabelo renovados, plenamente
penteados e pintados com uma cor loura
para retirar toda a respeitabilidade ou seriedade que conseguia transmitir
através do meu visual. Os dedos, possuidores de unhas totalmente roídas graças
ao nervosismo de um novo ciclo de acontecimentos totalmente renovado nas
últimas semanas, mexiam ternamente no meu futuro capilar. Devoto à grande nação
de superficialidade nas horas vagas, o meu sorriso orgulhava-se da nova pessoa
que ambicionava ser. Pesa-me nos ombros a ambição que tenta corroer e apaixonar
a minha mente, sem qualquer tipo de envenenamento no meio do processo, como se
fosse uma limpeza vasta aos vestígios mais insignificantes do passado (e nunca
esconderei o uso das comparações para descrever as minhas sensações, já que
sentimentos não podem ser usados no novo estilo de vida que se adivinha num
futuro demasiado próximo dos meus pés). O vento soprava à minha nova aparência,
um dourado com falta de brilho graças ao início de uma noite rotulada como
insignificante, assim como todas as outras que passaram a correr pela minha
existência, a minha alma nunca sentiu um pingo de força ou presença todas as
vezes em que tinha o rabo sentado na cadeira do quarto para estar em frente ao ecrã
de um computador.
As peles um tanto ou quanto arrancadas dos
dedos incomodavam os nervos do meu corpo, dando o alerta à minha mente para uma
nova sensibilidade. Os pequenos choques eléctricos percorriam os pormenores
calejados pelo percorrer de minutos, de horas, dias e anos. A última palavra, a que contém uma força extraordinária em
relação à calosidade de marcas deixadas na pele enrugada, grita todos os dias
ao microfone da minha mente numa angústia desmedida para me trazer de volta à
realidade. Há tantos anos que resolvi desaparecer de um cenário de perfeita
plenitude para me dedicar aos sonhos plantados no coração, para dar força
aos orgasmos na caixa torácica ou para ter sexo com as tintas rosas que teimo
em oferecer às paredes do meu corpo, humedecido e recheado de porosidades de
tabaco, o objecto que incendeia a minha existência e o maligno de todos os
vícios que podem circular nas minhas veias (nunca azuis, já que a minha pele é
tão morena. Nunca serei da realeza?). Os meus dentes anseiam por retirar todo o
vestígio de pequenas peles que ousam dormir ao pé das minhas unhas, num recheio
de radioactividade desmedido e acelerador de sensações trágicas, dignas de
estarem em cima de um palco e de se exibirem. Uma língua demasiadamente
perversa ousa em atentar lentamente demasiados desejos obscenos, presos na profundidade das minhas angústias filosóficas.
Nestes dias de calor intenso, afasto chás ou qualquer outro tipo de
líquidos a temperaturas elevadas para não sentir a pele a sair do corpo numa
imaginação desajustada da serenidade e tranquilidade. Consigo sentir uma
espécie de corvo a passar pelos meus olhos, aludindo a sensações de morte
intensas e excitantes, sem qualquer tipo de esforço ou ressuscitação mental.
No momento
em que os dedos passam pelos meus renovados cabelos louros, todas as náuseas
existências que poderão aproximar-se do meu
corpo afastam-se, plenas em
abandonar o meu ego um quanto despedaçado e actualizado. As minhas pernas
caminham até ao meu quarto renovado, recheado do pó que tantas vezes me faz
companhia nos dias de solidão atenuante. (Vou ouvindo os tiquetaques do relógio
inexistente em uma das paredes, na ânsia de esperar pelo verdadeiro apocalipse
do coração). Deixo que o coração morra momentaneamente, os fantasmas entram em
mim e violam os meus direitos corporais. Não ousam remexer nos espirituais ou
ancestrais. Percorri o longo caminho desde o estabelecimento que resolveu
aceitar (mas não compreendeu) as minhas pequenas mudanças com um cigarro nas
mãos e com todas estes desejos a empurrar os pulmões, os rins e o fígado.
Quando cheguei a casa fui directamente até ao
quarto.
E não aconteceu
mais nada. O meu cérebro, demasiado
refinado pelos burgueses do século XXI, perguntou-me se tinha acontecido alguma
coisa nos minutos anteriores. Disse simplesmente que não, não aconteceu
absolutamente nada.
8 comentários:
Como sempre...Magnífico!
:D
Muito obrigado, Rafaela!
Fico-te agradecido :D
E queres tu apagar o blog? :| Bem me parecia que não...
Podias identificar-te, anónimo? Por favor!
Sim, essa ideia ainda não está colocada de parte já que este espaço não me satisfaz como antes.
Sou uma pessoa que te segue no twitter, não sabes quem sou. x)
Mas devias colocar essa ideia de parte. Satisfazer os outros também é uma boa forma de encontrar satisfação no que fazemos.
Sinceramente, eu sei que satisfazer outros pode ser um caminho para encontrarmos satisfação individual. Mas em primeiro tenho sempre de encontrar satisfação pessoal, sabes? A única coisa que me impede de apagar este espaço é o background. São mais de três anos de memórias contidas por aqui e custa-me apagar absolutamente tudo, a partir do momento em que sei enumerar o estado de espírito com que estava quando escrevi x ou y texto. Mas ainda não sei.
Talvez seja por pessoas como tu que me façam manter isto. Mas preciso de descansar dele.
Sim, eu sei que a vontade de fazer algo tem que partir primeiro de nós. Até porque quando começaste este blog, a inspiração partiu sempre de ti. Só a partir do momento em que começaste a cativar leitores é que pudeste dizer que encontraste a tua satisfação neles. Até lá encontravas satisfação apenas no teu ser criativo.
Essa ideia de quereres descansar é um ponto de vista teu, é uma necessidade tua. Mas parares é quase o mesmo que estares a apagar algo que não queres partilhar. Quando não escrevemos é porque não queremos registar as memórias. Queremos ficar com elas apenas na mente e não no papel...
Parabéns pela tua escrita David!
Sigo te!
www.theglamourousworld.blogspot.com
xo DC
Enviar um comentário