13 outubro, 2011

Angústias filosóficas (num cabelo louro),


Quando os raios solares desaparecem entre os prédios que vão compondo o meu cenário (que tenta tornar-se, com todas as forças, no meu habitual ou melhor rotineiro) os meus dedos passavam sobre os meus fios de cabelo renovados, plenamente penteados e pintados com uma cor loura para retirar toda a respeitabilidade ou seriedade que conseguia transmitir através do meu visual. Os dedos, possuidores de unhas totalmente roídas graças ao nervosismo de um novo ciclo de acontecimentos totalmente renovado nas últimas semanas, mexiam ternamente no meu futuro capilar. Devoto à grande nação de superficialidade nas horas vagas, o meu sorriso orgulhava-se da nova pessoa que ambicionava ser. Pesa-me nos ombros a ambição que tenta corroer e apaixonar a minha mente, sem qualquer tipo de envenenamento no meio do processo, como se fosse uma limpeza vasta aos vestígios mais insignificantes do passado (e nunca esconderei o uso das comparações para descrever as minhas sensações, já que sentimentos não podem ser usados no novo estilo de vida que se adivinha num futuro demasiado próximo dos meus pés). O vento soprava à minha nova aparência, um dourado com falta de brilho graças ao início de uma noite rotulada como insignificante, assim como todas as outras que passaram a correr pela minha existência, a minha alma nunca sentiu um pingo de força ou presença todas as vezes em que tinha o rabo sentado na cadeira do quarto para estar em frente ao ecrã de um computador.
As peles um tanto ou quanto arrancadas dos dedos incomodavam os nervos do meu corpo, dando o alerta à minha mente para uma nova sensibilidade. Os pequenos choques eléctricos percorriam os pormenores calejados pelo percorrer de minutos, de horas, dias e anos. A última palavra, a que contém uma força extraordinária em relação à calosidade de marcas deixadas na pele enrugada, grita todos os dias ao microfone da minha mente numa angústia desmedida para me trazer de volta à realidade. Há tantos anos que resolvi desaparecer de um cenário de perfeita plenitude para me dedicar aos sonhos plantados no coração, para dar força aos orgasmos na caixa torácica ou para ter sexo com as tintas rosas que teimo em oferecer às paredes do meu corpo, humedecido e recheado de porosidades de tabaco, o objecto que incendeia a minha existência e o maligno de todos os vícios que podem circular nas minhas veias (nunca azuis, já que a minha pele é tão morena. Nunca serei da realeza?). Os meus dentes anseiam por retirar todo o vestígio de pequenas peles que ousam dormir ao pé das minhas unhas, num recheio de radioactividade desmedido e acelerador de sensações trágicas, dignas de estarem em cima de um palco e de se exibirem. Uma língua demasiadamente perversa ousa em atentar lentamente demasiados desejos obscenos, presos na profundidade das minhas angústias filosóficas. Nestes dias de calor intenso, afasto chás ou qualquer outro tipo de líquidos a temperaturas elevadas para não sentir a pele a sair do corpo numa imaginação desajustada da serenidade e tranquilidade. Consigo sentir uma espécie de corvo a passar pelos meus olhos, aludindo a sensações de morte intensas e excitantes, sem qualquer tipo de esforço ou ressuscitação mental.
No momento em que os dedos passam pelos meus renovados cabelos louros, todas as náuseas existências que poderão aproximar-se do meu corpo afastam-se, plenas em abandonar o meu ego um quanto despedaçado e actualizado. As minhas pernas caminham até ao meu quarto renovado, recheado do pó que tantas vezes me faz companhia nos dias de solidão atenuante. (Vou ouvindo os tiquetaques do relógio inexistente em uma das paredes, na ânsia de esperar pelo verdadeiro apocalipse do coração). Deixo que o coração morra momentaneamente, os fantasmas entram em mim e violam os meus direitos corporais. Não ousam remexer nos espirituais ou ancestrais. Percorri o longo caminho desde o estabelecimento que resolveu aceitar (mas não compreendeu) as minhas pequenas mudanças com um cigarro nas mãos e com todas estes desejos a empurrar os pulmões, os rins e o fígado.
Quando cheguei a casa fui directamente até ao quarto.
E não aconteceu mais nada. O meu cérebro, demasiado refinado pelos burgueses do século XXI, perguntou-me se tinha acontecido alguma coisa nos minutos anteriores. Disse simplesmente que não, não aconteceu absolutamente nada. 

8 comentários:

Rafaela disse...

Como sempre...Magnífico!
:D

David Pimenta disse...

Muito obrigado, Rafaela!
Fico-te agradecido :D

Anónimo disse...

E queres tu apagar o blog? :| Bem me parecia que não...

David Pimenta disse...

Podias identificar-te, anónimo? Por favor!
Sim, essa ideia ainda não está colocada de parte já que este espaço não me satisfaz como antes.

Anónimo disse...

Sou uma pessoa que te segue no twitter, não sabes quem sou. x)
Mas devias colocar essa ideia de parte. Satisfazer os outros também é uma boa forma de encontrar satisfação no que fazemos.

David Pimenta disse...

Sinceramente, eu sei que satisfazer outros pode ser um caminho para encontrarmos satisfação individual. Mas em primeiro tenho sempre de encontrar satisfação pessoal, sabes? A única coisa que me impede de apagar este espaço é o background. São mais de três anos de memórias contidas por aqui e custa-me apagar absolutamente tudo, a partir do momento em que sei enumerar o estado de espírito com que estava quando escrevi x ou y texto. Mas ainda não sei.
Talvez seja por pessoas como tu que me façam manter isto. Mas preciso de descansar dele.

Anónimo disse...

Sim, eu sei que a vontade de fazer algo tem que partir primeiro de nós. Até porque quando começaste este blog, a inspiração partiu sempre de ti. Só a partir do momento em que começaste a cativar leitores é que pudeste dizer que encontraste a tua satisfação neles. Até lá encontravas satisfação apenas no teu ser criativo.
Essa ideia de quereres descansar é um ponto de vista teu, é uma necessidade tua. Mas parares é quase o mesmo que estares a apagar algo que não queres partilhar. Quando não escrevemos é porque não queremos registar as memórias. Queremos ficar com elas apenas na mente e não no papel...

Diana Cunha disse...

Parabéns pela tua escrita David!
Sigo te!
www.theglamourousworld.blogspot.com
xo DC